Estado de graça?

Estou feita em fanicos.
Nunca soube estar grávida nem o que será feito do tal estado de graça. Há dias em que não consigo perceber se tenho várias pequenas dores localizadas ou uma única dor generalizada. Na grande maioria dos dias o desconforto da gravidez, quase mitológico porque afinal nem é desconforto, é só "normal e faz parte", está aliado a todo um mundo doloroso e incapacitante que me deixa atordoada. Estou profundamente exausta e sem paciência absolutamente nenhuma para toda e qualquer tarefa do quotidiano, o que inclui educar os miúdos enérgicos que estão ali na divisão ao lado. Gostava de dizer que não faz mal, mas não é bem assim. Encho-me de culpa por isso, dou cabo do discernimento mental, esforço a capacidade física de me mexer. Agravo a dor que achei que seria apenas ciática (herança da primeira gravidez) mas afinal, pasmo-me porque está ali à vista de todos, uma variz gorda e bem azul, que lateja sempre que não descanso o suficiente. E eu nem a vi! Senti a dor durante largas semanas, mas nem me passou pela cabeça olhar para a perna, como se não olhar fizesse com que a dor desaparecesse.
Por entre puzzles, legos, cafés a fingir e conversas sobre nada de especial mas inadiáveis, lá me sento cautelosamente, para me levantar logo de seguida, porque aquela hemorróida (herança da segunda gravidez) me lembra que sentar não faz parte dos verbos dos meus dias. Não tenho disponibilidade física nem mental para parar e tratar, porque explicar aos miúdos que os cubos de gelo não se põem só nas testas negras ou nos copos de gin, me esgota o que resta da energia, e ia dar uma conversa longa e bastante divertida amanhã na escola.
Sou detentora de uma azia exagerada, uma urticária que vai e vem e uma sinusite que ficou para sempre. Há dias em que estou desolada e culpo as hormonas, há outros em que me culpo a mim ou a outra pessoa qualquer. Tenho a sensação de que daqui a umas semanas será triplamente difícil e que estas e outras fragilidades e dificuldades se aglomeram e ficam ali demasiado facilmente, taco a taco com tristezas mais profundas. 
Peço-lhe todos os dias que me resgate pacientemente, quando o brilho se começar a desvanecer e o sentido de humor se for embora. Hoje já me deu um ombro para limpar as lágrimas, e por isso, mas só por isso, prometo que não faço mais piadas sobre a sua santa terrinha, pelo menos até amanhã. 


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