No colo das mães.

Nos dias de tratamentos invasivos, preparamos a logística da vida que não tende a desacelerar, mobilizamos a mãe que é a minha, inspiramos fundo e vamos. O caminho que se faz num ápice é o mais longo, o trânsito torna-se mais moroso e o sol parece não querer nascer como nos outros dias. Outrora, o estômago embrulhava-se, mas agora segue só pouco saciado, como que em solidariedade com o jejum quase sempre necessário nestas andanças. 
Quando se abrem as portas, a sala de espera vai-se compondo de famílias, às quais raramente falta uma mãe. Reconhecemo-nos das marcações do caminho que todas fizemos até ali, da voz embargada e do desembaraço próprio da força do hábito. Empurramos carrinhos, transportamos sacos, uma ponta de emoção no olhar e uma ruga de expressão na testa.
As mães, estas com quem partilho uma sintonia de sentidos, são como golfadas de ar fresco, num ambiente saturado de éter e conversas de circunstância. Respiram como eu, depressa ou devagar, consoante o que nos exigem e seguem rumo ao que lhes diz o instinto. Falamos a mesma língua e movemo-nos no mesmo espaço. Somos aquele gangue, o de sempre e de quase nunca, que está lá mesmo sem estar, e que nos conforta tantas vezes, num abraço invisível. 
Terminado o procedimento é correr a disponibilizar o meu colo de mãe ao meu coração, e sorrir com os olhos a quem está a fazer o mesmo, sem pudores e sem críticas, apenas com amor. É voltar a pegar nas rugas de expressão, nos sacos e nos carrinhos e desejar, com tudo o que temos, que o caminho seja, desta vez, mais curto e menos emotivo. É disponibilizar o ombro e o que resta do colo àquela mãe com quem partilhamos o dia e sair confortada com o gesto. E é chegar a casa e sentir instantaneamente que a mãe, que é a minha, aqui deixou também o seu colo, só pelo ar limpo e desenxovalhado que por cá se sente. 

As mães são mesmo do caraças.

Ilustração do meu colo, aos meus miúdos ❤

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